segunda-feira, 19 de julho de 2010

Gosto se discute?

Para iniciar esse post, cito, um pouco constrangido devido a superficialidade do assunto do qual irei tratar, um artigo da professora Maria da Graça Jacintho Setton, publicado no site da revista Cult, edição 128 (http://revistacult.uol.com.br/home/2010/03/uma-introducao-a-pierre-bourdieu), em que, de forma muito competente e didática, aborda-se, dentre outros assuntos, a produção do gosto, ou seja, a gênese do conjunto de preferências, escolhas que um indivíduo faz no decorrer de sua vida.
Sem dúvida, concordo com a máxima popularesca de que gosto é igual ânus, cada um tem o seu, mas também concordo com Pierre Bourdieu, citado por Setton, que afirma que “o gosto seria, (...) o resultado de imbricadas relações de força poderosamente alicerçadas nas instituições transmissoras de cultura da sociedade capitalista”, ou seja, uma produção que encontra respaldo numa esfera mais coletivizada, social.
Individual, coletivo, o que importa mesmo é que o gosto por determinadas coisas nesse mundo têm levado várias pessoas, curiosas ou entediadas, a enveredar-se por caminhos prazerosos ou não, no intuito de conhecer, vivenciar, descobrir, redescobrir...
Nessa de conhecer, vivenciar, descobrir ou redescobrir as coisas, movido por meu “gosto” peculiar por coisas gordurosas e “mal-emjambradas”, vi-me, nesta última quarta-feira, dia 14 de julho, imerso em um grande acontecimento social: uma feirinha (essas de rua, com gente, barracas e fumaça, de fritura e de cigarro), localizada na Rua Araguari, bairro Santo Agostinho, aqui em Belo Horizonte. Lugar interessante, pessoas bebendo cerveja, ou melhor, Skol e Brahma, latões ou latinhas, degustando guloseimas das mais variadas formas e texturas.
Lá estava eu, “embriagando-me” com uma lata quente de cerveja (tsc.) e segurando uma porção fria de feijão tropeiro, quando fui indagado por um amigo que perguntou a mim e a si mesmo o porquê das pessoas trocarem o conforto de um bar, com mesas e iluminação impecável, pelo ambiente semi-limpo, semi-cheio, semi-confortável de uma feira no meio da rua, com direito a banheiros químicos, banquinhos e esquema de distribuição de caixas de isopor com latinhas de cerveja para os habitués.
Concordando com o meu nobre conviva, acho que uma palavra resume tudo isso: despojamento. Vamos ao conceito. Despojamento, segundo é o ato de despojar, ou seja, privar do que revestia, adornava ou cobria; despir; desnudar. Será que o que leva as pessoas a uma feirinha de rua, sem nenhum conforto para o consumo, é a necessidade de despir-se da máscara social, adquirida através da forçosidade da vida cotidiana, consubstanciada num convívio social pós-moderno que ainda pede uma ostentação digna dos tempos do romantismo? E se esse despojamento fizer parte de uma rede de ações que algumas mentes pretensamente contestadoras assumem, no ímpeto de criticar um comportamento social que está posto e referendado por uma cultura baseada muito mais na aparência do que na essência das coisas? Sem dúvida são boas vias de acesso para um caminho de análises mais profundas.
De qualquer forma, cumprindo o papel a que se presta esse singelo blog, se esse post despertou no leitor a vontade de conhecer tal feirinha, por despojamento ou por curiosidade gastronômica, experimentem o feijão tropeiro da barraca da Loira para se arrependerem, com exceção do torresmo e do ovo frito que o acompanham, além do frango com ora pro nobis, de uma barraca da qual não lembro o nome, mas que, com certeza frequentarei na próxima quarta-feira, para degustá-lo pela primeira vez.

6 comentários:

  1. Eu conheço a feirinha. E quando fui, foi pela variedade de comida ofertada num mesmo lugar. Do acarajé ao milho verde cozido.

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  2. Adorei Nando,
    Saudade do seu senso critico, inovador.
    Dani

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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  4. Frequentava uma feirinha similar no bairro Sta Tereza as quintas a noite, as pessoas do bairro levavam suas próprias cadeiras de plástico para desfrutar uma cerveja quente com corforto pessoal e intrasferível. Sem dúvida era o romantismo que levava até lá. Hoje acho que essa história está fora de moda, frequentaria a feira apenas pela fritura. Iguarias típicas engorduradas reunidas por um preço acessível, isso sim é um clássico.

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